segunda-feira, 11 de outubro de 2010

TROPA DE ELITE 2 – A realidade por trás do filme

Logo no início do filme uma advertência que normalmente vemos só no final do filme, nos créditos: “Apesar das coincidências com a vida real, os personagens deste filme são fictícios”. É... o filme começa bem, deixando o espectador atento para a constatação da realidade que o filme espelha. E é isso que torna Tropa de Elite 2 ainda mais bombástico e desolador do que seu antecessor.

Se em Tropa de Elite 1, Padilha mostrou como os burguesinhos das classes média e alta dão sustentação ao problema do tráfico de drogas nos morros cariocas, em Tropa 2 ele vai responsabilizar Brasília, enquanto mãe de toda a política brasileira, como a produtora e mantenedora da corrupção que rouba e desola o povo brasileiro – que, diria eu, é totalmente conivente, na medida em que vota em quem o rouba.

Em entrevista concedida à Folha de São Paulo no dia 17 de setembro (página E8), Padilha conta que todo o seu trabalho é fruto de muita pesquisa: “‘Não tenho criatividade para inventar histórias do nada’, explica. ‘O que eu sei fazer é pesquisar, pesquisar, pesquisar, aí bolar uma história para representar o que vi e embutir uma crônica social.’” Confesso que eu preferia acreditar que Padilha é um louco, um psicopata, ou cheirado que tem uma imaginação fantástica. Mas, infelizmente, o que o filme mostra é a expressão mais crua e nua da realidade que nos cerca, nos violenta e nos manipula – sem que, muitas vezes, percebamos.

A violência explícita do filme não é nada, frente à violência moral à qual somos submetidos e subjugados por políticos corruptos e corruptores aos quais servimos, muitas vezes sem nos dar conta. Se você se sentir chocado com o linguajar do filme, deverá reservar espaço para se chocar muito mais com o descaso com o qual políticos e polícia tratam o povo ao qual deveriam servir.

Em meio a esse caos tupiniquim, destaca-se o herói, igualmente tupiniquim, o Capitão Nascimento. Esse herói totalmente verde e amarelo é o nosso ideal, ao mesmo tempo em que é a projeção de nós mesmos. Contraditório, violento, com atitudes das quais se envergonha é, paradoxalmente justo e incorruptível. O Capitão Nascimento é o grande herói nacional porque ele se tem a coragem de abrir a boca e apontar o dedo diante de todos os corruptos que se beneficiam do sistema (máquina governamental) para usufruir de benesses pessoais oprimindo, dominando, matando, calando, mentindo e fazendo o que bem entendem em benefício próprio. Ao abrir a boca e denunciar os corruptos, Nascimento mostra que está disposto a ir até as últimas consequências a fim de desmascarar o sistema, mesmo correndo riscos, mesmo colocando sua cabeça a prêmio. Sua atuação é heróica mas também denuncia nossa acomodação diante do que passa diante dos nossos olhos, pois simplesmente nos acostumamos com a miséria humana, seja esta vestida de pobreza ou de corrupção. Diante dela, calamo-nos e nos omitimos – e, portanto, somos coniventes e acabamos por contribuir para a mesma.

Almejamos o bem comum, a dignidade humana, o fim da corrupção – mas não fazemos muito para mudar o quadro. Nascimento faz, mesmo que isso lhe custe caro. Quem será o nosso herói nacional fora das telas?

Padilha tem uma visão científica da vida, de acordo com sua entrevista à Folha. Vê a política brasileira como resultado do processo evolutivo darwiniano, no qual as regras de seleção definem as características das pessoas selecionadas e, no Brasil, as regras favorecem os corruptos e desonestos. Sendo que não crê em Deus, tudo o que lhe resta é a visão científica da vida, com a qual percebe e desmascara a realidade com coragem e autenticidade. Seja em seu discurso pessoal, seja encarnado na brutalidade heróica do Capitão Nascimento, Padilha acaba por exercer uma função profética segundo os padrões da profecia bíblica do Antigo Testamento, que não fazia previsões, mas denunciava o erro, a injustiça e a inverdade, diante de quem quer que fosse. Assim, os profetas eram os anti-heróis que tinham a coragem de sair da acomodação. Sem querer, Padilha é um profeta contemporâneo – quem tem olhos e ouvidos, que veja e ouça.

3 comentários:

  1. Eu nao vi o filme e nao sei se quero ver. Odiei o primeiro e nossa leitura é diferente.

    Na minha opiniao o fio da història nao é uma critica aos burguezinhos, como dizes, mas ao sistema.

    Fiquei assustado e procupado em ver o treinamento do Bope. Se é verdade que é daquele jeito, nao podem ser considerados heròis, mas idiotas.

    Nao creio que bandido tenha de morrer, mesmo se mata. O problema é o sistema que vivemos.

    A falha na segurança pùblica é uma doença cronica do paìs. Os Estados, responsàveis direto por essa àarea, se omitem. Em SP é um desastre. Os presìdios sao fabricas de assassinos. Alckimin foi acusado por corrpçao e nao foi julgado. Pior, foi eleito. Ninguém diz nada. Quando os corruptos adversàrios agem, os jornais enfatizam e até julgam, mesmo antes da sentença. Sim, até aì nada de mal, o problema é que quando a coisa é com o PSDB, tudo corre na sordina.

    Pq?

    Creio que um bom filme é Salve Geral.

    Ans

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  2. Obrigado pelo comentário, Jota. Cara, nao sei quando é que esse filme vai chegar aí na Europa, mas decididamente você deve assistir. Ele não é violento como o primeiro, tem uma trama muito mais intrincada. Não sou pró-violência, mas é fato que entre o mundo das nossas idéias e ideais (sorry pelo trocadilho) e a ação real no meio do lixo que é o submundo do crime, independentemente da cor do colarinho há muito mais dúvidas do que certezas, incoerências do que atitudes nobres. A máquina da corrupção é muito maior do que a nossa capacidade de acreditar. O TE2 aborda isso. O super herói tupiniquim a que me refiro só pode ser entendido por quem assiste o filme - nao vou eu aqui contar e estragar as supresas, não é?! Os bandidos, no 2, são outros. Assista.
    Nao vi Salve Geral, mas vou procurar. abs

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  3. Sabe... se vc for analisar Tropa de Elite 2, observamos que é a mais pura verdade. mas quem será o capitão nascimento? Quem será o nosso herói? Quando aparece alguém é pq no mínimo está interessado em entrar no sistema tb. E se vc quiser ir contra o sistema, prepare-se: ele irá te devorar mais cedo ou mais tarde.

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